14 de nov. de 2012

Do desejo

II 
Ver-te. Tocar-te. Que fulgor de máscaras.
Que desenhos e rictus na tua cara
Como os frisos veementes dos tapetes antigos.
Que sombrio te tornas se repito
O sinuoso caminho que persigo: um desejo
Sem dono, um adorar-te vívido mas livre.
E que escura me faço se abocanhas de mim
Palavras e resíduos. Me vêm fomes
Agonias de grandes espessuras, embaçadas luas
Facas, tempestade. Ver-te. Tocar-te.
Cordura.
Crueldade. 
[Hilda Hilst]

31 de out. de 2012

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"Olhavam-se numa espécie de jogo do siso, com certo ar de majestades rivais e tranquilas, sem arrogância, nem baixeza, como se o mendigo dissesse ao céu:
- Afinal, não me hás de cair em cima.
E o céu:
- Nem tu me hás de escalar."
[Machado de Assis, Quincas Borba]

(Machado de Assis, sempre brilhante...)

30 de out. de 2012

endymion (trecho)



O que é belo há de ser eternamente
Uma alegria, e há de seguir presente.
Não morre; onde quer que a vida breve
Nos leve, há de nos dar um sono leve,
Cheio de sonhos e de calmo alento.
Assim, cabe tecer cada momento
Nessa grinalda que nos entretece
À terra, apesar da pouca messe
De nobres naturezas, das agruras,
Das nossas tristes aflições escuras,
Das duras dores. Sim, ainda que rara,
Alguma forma de beleza aclara
As névoas da alma. O sol e a lua estão
Luzindo e há sempre uma árvore onde vão
Sombrear-se as ovelhas; cravos, cachos
De uvas num mundo verde; riachos
Que refrescam, e o bálsamo da aragem
Que ameniza o calor; musgo, folhagem,
Campos, aromas, flores, grãos, sementes,
E a grandeza do fim que aos imponentes
Mortos pensamos recobrir de glória,
E os contos encantados na memória:
Fonte sem fim dessa imortal bebida
Que vem do céus e alenta a nossa vida.

[John Keats]

1 de out. de 2012

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"Tudo são pretextos a um coração agoniado" 
[Dom Casmurro, Machado de Assis] 

10 de set. de 2012

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"Preciso de magia. Não consigo viver em preto e branco."
[Friedrich Nietzsche] 

31 de ago. de 2012

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"Há tanta suavidade em nada se dizer,
E tudo se entender." 
[Fernando Pessoa]

26 de ago. de 2012

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"Cama de luar, lençol de estrelas, suspiros da hora da morte que são os suspiros e os ais da hora extrema do amor"
(Jorge Amado, Terras do Sem Fim) 

15 de ago. de 2012

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"Quem não compreende um olhar tampouco compreenderá uma longa explicação"
[Mário Quintana] 

4 de ago. de 2012

O último poema

Assim eu quereria o meu último poema
Que fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionais
Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas
Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume
A pureza da chama em que se consomem os diamantes mais límpidos
A paixão dos suicidas que se matam sem explicação. 
[Manuel Bandeira]

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"Que nada nos defina. Que nada nos sujeite. Que a liberdade seja nossa própria substância."
[Simone de Beauvoir]

25 de jun. de 2012

Canção de outono

Perdoa-me, folha seca,
não posso cuidar de ti.
Vim para amar neste mundo,
e até do amor me perdi.

De que serviu tecer flores
pelas areias do chão,
se havia gente dormindo
sobre o própro coração?

E não pude levantá-la!
Choro pelo que não fiz.
E pela minha fraqueza
é que sou triste e infeliz.
Perdoa-me, folha seca!
Meus olhos sem força estão
velando e rogando àqueles
que não se levantarão...

Tu és a folha de outono
voante pelo jardim.
Deixo-te a minha saudade
- a melhor parte de mim.
Certa de que tudo é vão.
Que tudo é menos que o vento,
menos que as folhas do chão...



[Cecília Meireles]

29 de mai. de 2012

O impossível carinho

Escuta, eu não quero contar-te o meu desejo
Quero apenas contar-te a minha ternura
Ah se em troca de tanta felicidade que me dás
Eu te pudesse repor
-Eu soubesse repor-
No coração despedaçado
As mais puras alegrias de tua infância! 
[Manuel Bandeira]

23 de mai. de 2012

as rosas

Quando à noite desfolho e trinco as rosas
É como se pendesse entre os meus dentes
Todo o luar das noites transparentes,
Todo o fulgor das tardes luminosas,
O vendo bailador das Primaveras,
A doçura amarga dos poentes,
E a exaltação de todas as esperas. 
[Sofia de Melo Breyner]

20 de mai. de 2012

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"Ao mesmo tempo que imaginário - era um mundo de se comer com os dentes, um mundo de volumosas dálias e tulipas."
[Clarice Lispector] 

18 de mai. de 2012

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"Cruzou os braços num desespero tão heroico que tudo se alargou no espaço pra conter o silêncio daquele penar." 
[Macunaíma, Mário de Andrade] 

7 de abr. de 2012

Via Láctea

"Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...

E conversamos toda a noite, enquanto
A Via Láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?"

E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e entender estrelas!"

[Olavo Bilac]

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"Também acho uma delícia quando você esquece os olhos em cima dos meus"
[Chico Buarque] 
 

4 de abr. de 2012

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"E quem sabe se os vaga lumes, luzindo cá embaixo, não seriam para mim como rimas das estrelas, e esta viva metáfora não me daria os versos esquivos, com os seus consoantes e sentidos próprios?"
[Dom Casmurro, Machado de Assis] 

3 de abr. de 2012


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"fecharia os olhos sob os anéis dos astros e entre os violinos e os fortes poços da noite, descobriria a ardente ideia da minha vida." 
[herberto helder] 

2 de abr. de 2012


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"Fui à janela indagar da noite por que razão os sonhos hão de ser assim tão tênues que se esgarçam ao menor abrir de olhos ou voltar de corpo, e não continuam mais."
[Dom Casmurro, Machado de Assis] 
 

19 de mar. de 2012

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"confie no seu coração
se os mares explodirem em chamas
(e viva pelo amor
mesmo que as estrelas se movam para trás)"
e e cummings

17 de mar. de 2012

desencanto


Eu faço versos como quem chora
De desalento... de desencanto...
Fecha o meu livro, se por agora
Não tens motivo nenhum de pranto.

Meu verso é sangue. Volúpia ardente...
Tristeza esparsa... remorso vão...
Dói-me nas veias. Amargo e quente, 
Cai, gota a gota, do coração.

E nestes versos de angústia rouca, 
Assim dos lábios a vida corre, 
Deixando um acre sabor na boca.

- Eu faço versos como quem morre.

[Manuel Bandeira]